Wan Yu Chih
Não faz muito tempo, a expressão ‘Inteligente’ passou a ser utilizada com frequência, como sinônimo de modernidade e eficiência possibilitadas pelo emprego intensivo da tecnologia. A GOL Linhas Aéreas foi uma das primeiras a fazer isso, e lançou o conceito de linhas aéreas ‘inteligentes’. O uso da internet, para compra de passagens pelo público, possibilitou agilidade, conveniência e redução de custos com comissões de agências. Com escalas de voo mais rápidas, em parte graças às outrora e famosas barrinhas de cereais servidas no serviço de bordo, a GOL logrou realizar um número maior de voos por aeronave que a concorrência.
Um telefone celular também pode ser inteligente. O ‘iPhone’ da Apple revolucionou o mercado, oferecendo uma nova gama de recursos ao usuário de telefone móvel. Até as roupas podem ser ‘inteligentes’. Roupas confeccionadas em tecidos desenvolvidos com nanotecnologia oferecem melhor proteção térmica, transpiração, ação bactericida e até mesmo maior proteção em casos de queda do usuário. Para acompanhar o progresso tecnológico, os sistemas de transporte também estão se modernizando, e temos, hoje em dia, os chamados 'Sistemas Inteligentes de Transporte'.
Sistemas inteligentes de transporte, ou ITS, é a denominação dada às soluções de eletrônica, tecnologia de informação e comunicação sem fio, aplicadas ao transporte, para a melhoria da segurança, mobilidade e produtividade, poupando vidas, tempo e dinheiro. O ITS é a convergência entre aparelhos eletrônicos, comunicação sem fio e softwares.
No mundo da tecnologia, os profissionais do setor de transportes podem se perder no meio de tantas siglas e expressões técnicas, e que formam uma verdadeira sopa de letras. Não bastasse saber o que significa ITS (Intelligent Transportation Systems), GPS (Global Positioning System – sistema de localização geográfica pela rede de satélites orbitais), GPRS (General Package Radio System – sistema para transmissão de dados por telefonia celular de tecnologia GSM), GSM (Global System Mobile Communications), 3G, WiMAX, temos ainda o GPSS e 4G, que são as novas tecnologias que chegarão em breve.
Por volta da década de 80, os primeiros sistemas de monitoramento automático de frotas (através de equipamentos de detecção fixos em terra) passaram a ser utilizados em cidades norte-americanas e europeias. Na década de 90 os sistemas eletrônicos de informação ao passageiro começaram a ser implantados, fornecendo previsões horárias de chegada em painéis eletrônicos nos pontos de parada e roteiros de viagem pela internet. Em 1991, a associação norte-americana ITS America, foi criada por empresas do setor rodoviário, para promover e desenvolver sistemas de ITS nos Estados Unidos. Ao mesmo tempo em que novos dispositivos foram desenvolvidos para monitorar o tráfego nas estradas e automatizar a cobrança em pedágios, as inovações foram posteriormente estendidas para o transporte urbano de passageiros.
Desde o início dos anos 90, vimos assistindo a adoção do sistema de bilhetagem automática por diversas cidades brasileiras. A partir de meados da mesma década, surgiram as primeiras iniciativas de monitoramento de frotas e utilização de vídeo câmeras por empresas operadoras em algumas cidades brasileiras. Em 2008, ocorreram licitações de concessão para operação do transporte urbano, com a exigência de se implantar um sistema bastante completo de ITS nas cidades de Goiânia e Belo Horizonte. Além de diversas cidades que, no momento, estão preparando licitações para a contratação de sistemas de monitoramento de frotas e informação ao passageiro.
Basicamente, são utilizados três tipos de tecnologias: (i) equipamentos eletrônicos, (ii) comunicação e (iii) tecnologia da informação. Entre estas estão o GPS, para posicionamento geográfico, vídeo câmeras, sensores de telemetria para informação do estado do motor, abertura de portas, comunicação de voz, transmissão de dados para os servidores, softwares variados, desde os ‘firmwares’ – aqueles que são instalados nos aparelhos embarcados – aos aplicativos especialistas de gestão de frotas e fornecimento de informação ao passageiro. Mas o que realmente torna um conjunto de componentes um ITS é a integração entre eles: hardware com hardware, software com software.
Gestão de frotas, informação ao passageiro e cobrança automática são as principais aplicações de ITS no transporte urbano. Os benefícios, para a empresa, são a maior produtividade da frota e tripulação, maior segurança na tomada de decisão e rapidez na execução da ação planejada, resultando em economia. Para o passageiro, melhor nível de serviço, pontualidade e regularidade. E o órgão gestor beneficia-se tendo um melhor aparelhamento para gestão, modernizando a sua forma de trabalho.
Um sistema de gestão de frotas é normalmente composto por uma solução de programação operacional, uma solução de monitoramento de frotas em tempo real e recursos de comunicação da Central de Controle Operacional com o motorista. A solução de programação operacional tem por objetivo permitir uma melhor alocação das viagens em relação à demanda, melhor aproveitamento e utilização da frota, e melhor aproveitamento da tripulação. A solução de monitoramento de frota, por sua vez, possibilita maior aderência do realizado sobre o programado, pontualidade, regularidade, rapidez e minimização de impactos dos desvios operacionais.
O sistema de informação ao passageiro pode ser composto por uma solução de fornecimento de informações pela internet, por telefone celular, ou até mesmo por televisão a cabo, informando o usuário sobre itinerários, pontos de ônibus, tarifas, horários e planos de viagem. Este último, resultante de modernos algoritmos matemáticos, informa o roteiro de viagem a ser seguido, com linhas de ônibus, baldeações e trechos de caminhada a pé, para completar a viagem entre um ponto de origem e outro de destino. Painéis de horários podem ser afixados nos terminais de ônibus e pontos de parada, anunciando, em tempo real, a previsão de chegada dos coletivos, por rota. Displays podem ser instalados no interior dos ônibus, para informar a próxima parada.
É nessa área que o País mais evoluiu em termos de utilização. Também chamada de bilhetagem automática, possibilita inúmeras vantagens, entre elas maior agilidade e segurança nas operações. Salvo exceções, hoje em dia, os itens de hardware são considerados ‘commodities’. Os softwares, por outro lado, diferenciam-se pela inteligência que foi agregada dentro de si. Fruto da capacidade inovadora, da experiência do desenvolvedor e da base de clientes que colaboraram para o seu desenvolvimento, os softwares são determinantes para o sucesso das soluções de ITS.
Frequentemente, ser inteligente é confundido com “ter informação”. Mas inteligência é mais que isso. Saber processar informação também não significa ser inteligente. Um computador processa informação e nem por isso ele é inteligente. Conceitualmente, um ‘Sistema inteligente é aquele capaz de sentir o seu ambiente, aprender, decidir e agir, em diversas situações, para alcançar um objetivo’. Por isso, um sistema inteligente, precisa ter sensores, para perceber o que se passa no meio ambiente, memória para armazenar o objetivo a ser perseguido, além de um sem número de respostas face às situações possíveis, e um atuador, que age sobre o mesmo meio ambiente, em resposta ao estímulo inicial, além de contar com um procedimento que lhe permite aprender (ou memorizar) novas relações de estímulo e reação que sejam adequadas. A primeira lembrança que nos vem à mente é a do HAL – um computador do filme 2001 Uma Odisseia no Espaço.
No cotidiano, o que se encontra são exemplos de automatismos, desde os mais simples, como os de regulação da temperatura ideal por aparelhos de ar condicionado, até automatismos mais sofisticados, como os sistemas de tração variável ou frenagem presentes em certos automóveis. A Secretaria de Defesa dos EUA vem patrocinando, com o projeto DARPA, há mais de uma década, o desenvolvimento de automóveis capazes de andar sozinhos, sem motorista, por ruas comuns, mantendo distância dos outros veículos, fazendo curvas nas esquinas e parando nos faróis de trânsito. A GM anunciou, em 2008, que pretende ter esses automóveis que andam sem motorista em autoestradas - os chamados ‘driverless car’- em regime comercial até 2018.
O que diferencia os verdadeiros sistemas inteligentes dos sistemas meramente automáticos (mesmo aqueles com um alto grau de automatismo) é a capacidade de aprender novas situações e ações, o que requer softwares com algoritmos de inteligência artificial. Comercialmente, em outros mercados, a quantidade de soluções disponíveis restringe-se a pouquíssimos casos. Nos transportes, ainda não se conhece nenhuma aplicação de ITS que seja realmente inteligente.
Na prática, o papel de ser inteligente recai sobre as pessoas que utilizam os sistemas, para que se faça bom uso das soluções disponíveis, sejam passageiros ou técnicos das empresas. Por exemplo: o rastreamento de frotas e controle em tempo real pode fornecer, automaticamente, alertas e diagramas, todavia, a avaliação da situação e a ação necessária só pode ser tomada pelo motorista, ou pelo agente do centro de controle operacional.
Estamos rodeados de soluções tecnológicas que outrora eram consideradas avançadas, e que, entretanto, já fazem parte do nosso dia-a-dia: o e-commerce é utilizado para compras pela internet e por telefone celular; o e-learning, já bastante difundido nas escolas e universidades, é utilizado para educação à distância, pela internet; os aplicativos para telefone celular, como o email e softwares para troca de dados com servidores corporativos; sem falar nos próprios ônibus atuais, com sua gama enorme de equipamentos eletrônicos embarcados. Impossível imaginar o transporte urbano não adotar as inovações tecnológicas que estão disponíveis.
Os sistemas de transporte público irão aderir? Eles irão se adaptar aos novos tempos? Não temos dúvidas de que assim o farão. Nenhuma organização de transporte poderá evitar o uso de sistemas modernos de apoio à operação e de modernização do serviço ao passageiro. Existe hoje uma combinação de fatores que irá promover uma revolução no setor. A maior capacidade dos computadores, o barateamento dos equipamentos eletrônicos e da comunicação de dados, aliada ao avanço dos softwares, irão alavancar esse processo, mas no final, é a demanda por melhores serviços pela sociedade é que irá ditar o ritmo da inovação.